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terça-feira, 19 de outubro de 2010

Para Refletir

Tecnologia e Educação - As mídias na prática docente

Livro organizado por Wendel Freire discute o uso de mídia na prática docente e como as transformações tecnológicas e comunicacionais mudaram as relações entre os indivíduios e afetaram a escola e o modo de ensinar.

“As tecnologias não são boas ou más. Depende do uso que você faz delas.” A frase, na introdução do livro Tecnologia e Educação – As mídias na prática docente, organizado por Wendel Freire, traduz bem com que temas o leitor vai se deparar nas páginas seguintes.
Os autores convidam o leitor a refletir sobre como a escola tem disponibilizado aparelhos e tecnologias a seu público, por exemplo, e se está debatendo e/ou procurando entender como essa evolução tecnológica gera transformações na sociedade.

O artigo de Valter Filé, por exemplo, faz um passeio pela evolução das tecnologias ao longo do tempo, discute as relações entre cultura oral e escrita, a chegada das mídias eletrônicas... sempre na perspectiva de que não adianta colocar em uso todos os meios ou criticá-los, sem conhecer suas nuances e refletir sobre seus usos e a quem se destina. Ou seja, levar em conta o contexto desse uso e o enorme potencial transformador que as tecnologias possuem.

Dimmi Amora, por sua vez, questiona se o professor está preparado para ser dono de um meio de comunicação. Ele lembra que a evolução das comunicações de massa está diretamente ligada à evolução da humanidade e que hoje os meios que surgem, já carregam a possibilidade de interação entre o produtor de conteúdo e o público a quem se destina suas mensagens.

Ou seja, hoje, “a participação de quem recebe a mensagem é elemento constituidor da própria mensagem”. Todos nós somos produtores em potencial de um site, um blog, uma revista, um jornal....Isso aumenta nossa responsabilidade pelo que produzimos, visto que seu alcance é bem maior.

Os professores devem preparar seus alunos, portanto, para enquanto audiência saberem a melhor maneira de criar produtos para os meios de comunicação, serem críticos em relação a eles, mas ao mesmo tempo saberem o que querem e o que fariam com um veículo na mão, aproveitarem as possibilidades que eles oferecem.

A autora afirma que a esperança, talvez única, para uma profunda transformação na produção dos meios de comunicação é a escola. E que aprender televisão, por exemplo, deve ser considerado tão importante quanto aprender literatura. A partir do momento em que estudantes aprendem sobre os meios e a produzir para os meios, tornam-se indivíduos mais responsáveis não só com a escola, como com a sociedade em volta dela.

Na mesma linha, Wendel Freire reflete sobre a presença maciça e veloz das informações na nossa sociedade e como estamos (ou não) processando essas informações e transformando-as (ou não) em conhecimento. Citando Sêneca, Wendel ressalta que “nenhum vento sopra a favor de quem não sabe para onde ir” e que temos que estar preparados para lidar com essa velocidade midiática.

Segundo o autor, uma das maneiras é trabalhar com os meios de comunicação nas escolas. Não apenas como recurso pedagógico, mas como objeto de estudo, “para que os jovens tenham uma compreensão menos superficial de sua época, da influência midiática no jogo democrático, no discurso ideológico e no consumo”. Para Wendel, qualquer projeto de sociedade e de educação deve levar em conta a mídia enquanto espaço público.

O artigo revela ainda uma pesquisa feita pelo autor junto a alunos de 5ª série de uma escola pública do Rio de Janeiro, que tiveram a oportunidade de conhecer o processo de produção de um jornal, debateram sobre mídia e, por fim, fizeram uma aula-passeio em sua comunidade adotando a postura de repórteres, fotografando e registrando tudo. O final da experiência foi a produção de um jornal produzido pelos alunos e que acabou sendo um exercício de reflexão crítica sobre a mídia e a sociedade.

Lígia Silva Leite estimula uma reflexão sobre diferentes momentos da cultura e como eles impactaram a forma de elaborar e representar o conhecimento. Ela defende que os educadores se perguntem de qual maneira querem que a mídia deve ser integrada ao processo pedagógico e, ao mesmo tempo, sugere que não seja de uma forma tecnicista, como mero recurso de apoio.

A autora defende que os educadores devem interagir com a mídia sem cobrança educativa, mas a partir de sua adequação à proposta pedagógica em questão, integrando-a ao processo educativo em consonância com a abordagem da tecnologia educacional. Além disso, ressalta que a escola de hoje deve ser “problematizadora, desafiadora, agregadora de indivíduos pensantes que constroem conhecimento colaborativamente e de maneira crítica. Nessa perspectiva o educador deve ser mais do que nunca um “estimulador, coordenador e parceiro do processo de ensino e aprendizagem e não mais um transmissor de conhecimento fragmentado em disciplinas”.

O livro traz ainda artigos de Marcos Silva analisando o aluno da geração digital, que tem levado a atitude para dentro da escola e exigido uma nova sala de aula e Edméa Oliveira Santos, que fala da aprendizagem em um ambiente interativo e espaço de autoria e co-autoria e da possibilidade de diálogos através de blogs ou outras interfaces digitais. E destaca a WebQuest, “atividade coletiva baseada na pesquisa orientada, em que quase todos os recursos e as fontes utilizadas para o desenvolvimento da atividade são provenientes da web”.

Ela estimula, porém, que os educadores criem projetos pedagógicos utilizando as possibilidades tecnológicas e comunicacionais, mas sempre levando em conta a interatividade.

Tecnologia e Educação – As mídias na prática docente
Wendel Freire (Org.), Dimmi Amora, Edméia dos Santos, Ligia Silva Leite, Marco Silva e Valter Filé
WAK Editora

Desafios da televisão e do vídeo à escola


Introdução

Estamos deslumbrados com o computador e a Internet na escola e vamos deixando de lado a televisão e o vídeo, como se já estivessem ultrapassados, não fossem mais tão importantes ou como se já dominássemos suas linguagens e sua utilização na educação.
A televisão, o cinema e o vídeo - os meios de comunicação audiovisuais - desempenham, indiretamente, um papel educacional relevante. Passam-nos continuamente informações, interpretadas; mostram-nos modelos de comportamento, ensinam-nos linguagens coloquiais e multimídia e privilegiam alguns valores em detrimento de outros.
A informação e a forma de ver o mundo predominantes no Brasil provêm fundamentalmente da televisão. Ela alimenta e atualiza o universo sensorial, afetivo e ético que crianças e jovens – e grande parte dos adultos - levam a para sala de aula. Como a TV o faz de forma mais despretensiosa e sedutora, é muito mais difícil para o educador contrapor uma visão mais crítica, um universo mais mais abstrato, complexo e na contra- mão da maioria como a escola se propõe a fazer.
A TV fala da vida, do presente, dos problemas afetivos - a fala da escola é muito distante e intelectualizada - e fala de forma impactante e sedutora - a escola, em geral, é mais cansativa. O que tentamos contrapor na sala de aula, de forma desorganizada e monótona, aos modelos consumistas vigentes, a televisão, o cinema, as revistas de variedades e muitas páginas da Internet o desfazem nas horas seguintes. Nós mesmos como educadores e telespectadores sentimos na pele a esquizofrenia das visões contraditórias de mundo e das narrativas (formas de contar) tão diferentes dos meios de comunicação e da escola.
Na procura desesperada pela audiência imediata, fiel e universal, os meios de comunicação hiper-exploram nossas emoções, fantasias, desejos, medos e aperfeiçoam continuamente estratégias e fórmulas de sedução e dependência. Passam com incrível facilidade do real para o imaginário, aproximando-os em fórmulas integradoras, como nas telenovelas e nos reality-shows como o Big-Brother e semelhantes.
Diante desse panorama, os educadores costumamos contrapor a diferença de funções e da missão da televisão e da escola. A TV somente entretém enquanto que a escola educa. Justamente porque a televisão não diz que educa o faz de forma mais competente. Ela domina os códigos de comunicação e os conteúdos significativos para cada grupo: os pesquisa, os aperfeiçoa, os atualiza. Nós educadores fazemos pequenas adaptações, damos um verniz de modernidade nas nossas aulas, mas fundamentalmente continuamos prendendo os alunos pela força e os mantemos confinados em espaços barulhentos, sufocantes, apertados e fazendo atividades pouco atraentes. Quem educa quem a longo prazo?
Como a televisão se comunica:
Os meios de comunicação, principalmente a televisão, desenvolvem formas sofisticadas multidimensionais de comunicação sensorial, emocional e racional, superpondo linguagens e mensagens, que facilitam a interação, com o público. A TV fala primeiro do "sentimento" - o que você sentiu", não o que você conheceu; as idéias estão embutidas na roupagem sensorial, intuitiva e afetiva.
A televisão e o vídeo partem do concreto, do visível, do imediato, próximo, que toca todos os desafios da TV e do vídeo à escola mexem com o corpo, com a pele, as sensações e os sentimentos - nos tocam e "tocamos" os outros, estão ao nosso alcance através dos recortes visuais, do close, do som estéreo envolvente.
Isso nos dá pistas para começar na sala de aula pelo sensorial, pelo afetivo, pelo que toca o aluno antes de falar de idéias, de conceitos, de teorias. Partir do concreto para o abstrato, do imediato para o mediato, da ação para a reflexão, da produção para a teorização.
A eficácia de comunicação dos meios eletrônicos, em particular da televisão, se deve também à capacidade de articulação, de superposição e de combinação de linguagens diferentes - imagens, falas, música, escrita - com uma narrativa fluida, uma lógica pouco delimitada, gêneros, conteúdos e limites éticos pouco precisos, o que lhe permite alto grau de entropia, de flexibilidade, de adaptação à concorrência, a novas situações. Num olhar distante tudo parece igual, tudo se repete, tudo se copia; ao olhar mais de perto, por trás da fórmula conhecida, há mil nuances, detalhes que introduzem variantes adaptadoras e diferenciadoras.
A força da linguagem audiovisual está em que consegue dizer muito mais do que captamos, chegar simultaneamente por muitos mais caminhos do que conscientemente percebemos e encontra dentro de nós uma repercussão em imagens básicas, centrais, simbólicas, arquetípicas, com as quais nos identificamos ou que se relacionam conosco de alguma forma.
Televisão e vídeo combinam a dimensão espacial com a sinestésica, ritmos rápidos e lentos, narrativas de impacto e de relaxamento. Combinam a comunicação sensorial com a audiovisual, a intuição com a lógica, a emoção com a razão. A integração começa pelo sensorial, o emocional e o intuitivo, para atingir posteriormente o racional. Exploram o voyeurismo, e mostram até a exaustão planos, ângulos, replay de determinadas cenas, situações, pessoas, grupos, enquanto ignoram a maior parte do que acontece no cotidiano. Mostram a exceção, o inusitado, o chocante, o horripilante, mas também o terno – um bebê desamparado, por exemplo. Destacam os que detêm atualmente algum poder – político, econômico ou de identificação/projeção: artistas, modelos, ídolos esportivos. Quando o perdem, desaparecem da tela.
A organização da narrativa televisiva, das situações, idéias e valores é muito mais flexível e contraditória do que a da escola. As associações são feitas por semelhança, por contraste, muitas vezes estéticos. As temáticas evoluem de acordo com o momento, a audiência, o impacto.
Os temas são pouco aprofundados, explorando os ângulos emocionais, contraditórios, inesperados. Passam a informação em pequenas doses (de forma compactada), organizadas em forma de mosaico (rápidas sínteses de cada assunto) e com apresentação variada (cada tema dura pouco e é ilustrado).
A televisão estabelece uma conexão aparentemente lógica entre mostrar e demonstrar. Mostrar é igual a demonstrar, a provar, a comprovar. Uma situação isolada converte-se em situação paradigmática, padrão, universal. Ao mesmo tempo, o não mostrar equivale a não existir, a não acontecer. O que não se vê, perde existência.

Estratégias de utilização da TV e do vídeo

Diante dessas linguagens tão sofisticadas a escola pode partir delas, conhecê-las, ter materiais audiovisuais mais próximos da sensibilidade dos alunos. Gravar materiais da TV Escola, alguns dos canais comerciais, dos canais da TV a cabo ou por satélite e planejar estratégias de inserir esses materiais e atividades que sejam dinâmicas, interessantes, mobilizadoras e significativas.
A televisão e a Internet não são somente tecnologias de apoio às aulas, são mídias, meios de comunicação.
Podemos analisá-las, dominar suas linguagens e produzir, divulgar o que fazemos. Podemos incentivar que os alunos filmem, apresentem suas pesquisas em vídeo, em CD ou em páginas WEB - páginas na Internet. E depois analisar as produções dos alunos e a partir delas ampliar a reflexão teórica.
A escola precisa observar o que está acontecendo nos meios de comunicação e mostrá-lo na sala de aula, discutindo-o com os alunos, ajudando-os a que percebam os aspectos positivos e negativos das abordagens sobre cada assunto. Fazer re-leituras de alguns programas em cada área do conhecimento, partindo da visão que os alunos têm, e ajudá-los a avançar de forma suave, sem imposições nem maniqueísmos (bem x mal).

Conclusão

A televisão, o cinema, a Internet e demais tecnologias nos ajudam a realizar o que já fazemos ou que desejamos. Se somos pessoas abertas, nos ajudam a comunicar-nos de forma mais confiante, carinhosa e confiante; se somos fechadas, contribuem para aumentar as formas de controle. Se temos propostas inovadoras, facilitam a mudança.
Educar com novas tecnologias é um desafio que até agora não foi enfrentado com profundidade. Temos feito apenas adaptações, pequenas mudanças. Agora, na escola, no trabalho e em casa, podemos aprender continuamente, de forma flexível, reunidos numa sala ou distantes geograficamente, mas conectados através de redes de televisão e da Internet. O presencial se torna mais virtual e a educação a distância se torna mais presencial. Os encontros em um mesmo espaço físico se combinam com os encontros virtuais, a distância, através da Internet e da televisão.
Estamos aprendendo, fazendo. Os modelos de educação tradicional não nos servem mais. Por isso é
importante experimentar algo novo em cada semestre. Fazer as experiências possíveis nas nossas condições concretas. Perguntar-nos no começo de cada semestre: “O que estou fazendo de diferente neste curso? O que vou propor e avaliar de forma inovadora?” Assim, pouco a pouco iremos avançando e mudando.
Podemos começar por formas de utilização das novas tecnologias mais simples e ir assumindo atividades mais complexas. Experimentar, avaliar e experimentar novamente é a chave para a inovação e a mudança desejadas e necessárias.
Caminhamos para uma flexibilização forte de cursos, tempos, espaços, gerenciamento, interação,
metodologias, tecnologias, avaliação. Isso nos obriga a experimentar pessoal e institucionalmente a
integração de tecnologias audiovisuais, telemáticas (Internet) e impressas.
Vivemos uma época de grandes desafios no ensino focado na aprendizagem. E vale a pena pesquisar novos caminhos de integração do humano e do tecnológico; do sensorial, emocional, racional e do ético; do presencial e do virtual; de integração da escola, do trabalho e da vida.

José Manuel Moran
Especialista em projetos inovadores na educação presencial e a distância

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